Decisão do STF

Marcelo Miranda teria recebido dinheiro da Odebrecht na campanha de 2010 por intermédio de Eduardo Cunha

Por Redação AF
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12/04/2017 10h06 - Atualizado há 5 anos
O Supremo Tribunal Federal (STF) divulgou a íntegra da decisão em que a Procuradoria-Geral da República pede a investigação do governador do Tocantins, Marcelo Miranda (PMDB), após ter o nome citado em delação de executivos da empreiteira Odebrecht. Segundo o Ministério Público, os delatores afirmaram que no ano de 2010, o Grupo Odebrecht efetuou repasse de valores ao então candidato ao governo do Estado de Tocantins. Tais pagamentos foram realizados a pedido do ex-Deputado Federal Eduardo Cunha, com o propósito de proteger interesses da empresa, sendo que as tratativas eram celebradas com o assessor de Marcelo Miranda, Herbert Brito (Buti), que é o atual presidente do Naturatins. Em 2010, Miranda disputou a vaga de senador, foi eleito, mas não assumiu o cargo. O nome do governador foi citado pelos delatores Mário Amaro da Silveira e Fernando Luiz Ayres da Cunha Santos Reis. Cabe, agora, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidir sobre o pedido de investigação. Em nota na noite dessa terça-feira (11), antes da divulgação dos detalhes do caso de Marcelo, a Secretaria Estadual de Comunicação (Secom) disse que o governador "foi somente citado, não houve indiciamento". "Mas vale considerar que todas as doações de campanha do governador foram feitas de forma legal, devidamente declaradas e as contas aprovadas", afirmou a secretaria na nota. Confira a íntegra da decisão. PETIÇÃO 6.782 (217) ORIGEM : pet - 6782 - SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PROCED. : DISTRITO FEDERAL RELATOR :MIN. EDSON FACHIN REQTE.(S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA DECISÃO: 1. Cuida-se de petição instaurada com lastro nas declarações prestadas pelos colaboradores Mário Amaro da Silveira (Termo de Depoimento n. 4) e Fernando Luiz Ayres da Cunha Santos Reis (Termos de Depoimento ns. 10 e 13). Segundo o Ministério Público, os colaboradores narram, em suma, que, no ano de 2010, o Grupo Odebrecht efetuou repasse de valores ao então candidato ao governo do Estado de Tocantins Marcelo de Carvalho Miranda. Tais pagamentos foram realizados a pedido do ex-Deputado Federal Eduardo Cunha, com o propósito de proteger interesses da empresa, sendo que as tratativas eram celebradas com o assessor de Marcelo Miranda, Herbert Brito. Afirmando que não existe menção a crimes praticados por autoridades detentoras de foro por prerrogativa de função nesta Corte, requer o Procurador-Geral da República o reconhecimento da incompetência do Supremo Tribunal Federal para a apuração dos fatos. Considerando que o suposto beneficiário das doações exerce o cargo de Governador do Estado de Tocantins, postula autorização para utilizar o material perante o foro competente, a saber, o Superior Tribunal de Justiça, a fim de que lá sejam tomadas as providências cabíveis. 2. De fato, conforme relato do Ministério Público, não se verifica, nesta fase, o envolvimento de autoridade que detenha foro por prerrogativa de função nesta Corte, o que possibilita, desde logo, o uso das declarações prestadas pelos colaboradores no juízo indicado como, em tese, competente. 3. Com relação ao pleito de levantamento do sigilo dos autos, anoto que, como regra geral, a Constituição Federal veda a restrição à publicidade dos atos processuais, ressalvada a hipótese em que a defesa do interesse social e da intimidade exigir providência diversa (art. 5º, LX), e desde que “a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação” (art. 93, IX). Percebe-se, nesse cenário, que a própria Constituição, em antecipado juízo de ponderação iluminado pelos ideais democráticos e republicanos, no campo dos atos jurisdicionais, prestigia o interesse público à informação. Acrescenta-se que a exigência de motivação e de publicidade das decisões judiciais integra o mesmo dispositivo constitucional (art. 93, IX), fato decorrente de uma razão lógica: ambas as imposições, a um só tempo, propiciam o controle da atividade jurisdicional tanto sob uma ótica endoprocessual (pelas partes e outros interessados), quanto extraprocessual (pelo povo em nome de quem o poder é exercido). Logo, o Estado-Juiz, devedor da prestação jurisdicional, ao aferir a indispensabilidade, ou não, da restrição à publicidade, não pode se afastar da eleição de diretrizes normativas vinculantes levadas a efeito pelo legislador constitucional. D’outro lado, a Lei 12.850/2013, ao tratar da colaboração premiada em investigações criminais, impôs regime de sigilo ao acordo e aos procedimentos correspondentes (art. 7º), circunstância que, em princípio, perdura, se for o caso, até o eventual recebimento da denúncia (art. 7º, § 3º). Observe-se, entretanto, que referida sistemática deve ser compreendida à luz das regras e princípios constitucionais, tendo como lastro suas finalidades precípuas, quais sejam, a garantia do êxito das investigações (art. 7°, § 2º) e a proteção à pessoa do colaborador e de seus próximos (art. 5º, II). Não fosse isso, compete enfatizar que o mencionado art. 7º, § 3º, relaciona-se ao exercício do direito de defesa, assegurando ao denunciado, após o recebimento da peça acusatória, e com os meios e recursos inerentes ao contraditório, a possibilidade de insurgir-se contra a denúncia. Todavia, referido dispositivo que, como dito, tem a preservação da ampla defesa como finalidade, não veda a implementação da publicidade em momento processual anterior. 4. No caso, a manifestação do órgão acusador, destinatário da apuração para fins de formação da opinio delicti, revela, desde logo, que não mais subsistem, sob a ótica do sucesso da investigação, razões que determinem a manutenção do regime restritivo da publicidade. Em relação aos direitos do colaborador, as particularidades da situação evidenciam que o contexto fático subjacente, notadamente o envolvimento em delitos associados à gestão da coisa pública, atraem o interesse público à informação e, portanto, desautorizam o afastamento da norma constitucional que confere predileção à publicidade dos atos processuais. Com esse pensamento, aliás, o saudoso Min. TEORI ZAVASCKI, meu antecessor na Relatoria de inúmeros feitos a este relacionados, já determinou o levantamento do sigilo em autos de colaborações premiadas em diversas oportunidades, citando-se: Pet. 6.149 (23.11.2016); Pet. 6.122 (18.11.2016); Pet. 6.150 (21.11.2016); Pet. 6.121 (25.10.2016); Pet. 5.970 (01.09.2016); Pet. 5.886 (30.05.2016); Pet. 5.899 (09.03.2016); Pet. 5.624 (26.11.2015); Pet. 5.737 (09.12.2015); Pet. 5.790 (18.12.2015); Pet. 5.780 (15.12.2015); Pet. 5.253 (06.03.2015); Pet. 5.259 (06.03.2015) e Pet. 5.287 (06.03.2015). Na mesma linha, registro o julgamento, em 21.02.2017, do agravo regimental na Pet. 6.138 (acórdão pendente de publicação), ocasião em que a Segunda Turma desta Corte, por unanimidade, considerou legítimo o levantamento do sigilo de autos que contavam com colaboração premiada, mesmo anteriormente ao recebimento da denúncia. No que toca à divulgação da imagem do colaborador, cumpre enfatizar que a Lei 12.850/2013 determina que, sempre que possível, o registro das respectivas declarações deve ser realizado por meio audiovisual (art. 4°, §13). Trata-se, como se vê, de regra legal que busca conferir maior fidedignidade ao registro do ato processual e, nessa perspectiva, corporifica o próprio meio de obtenção da prova. Em tese, seria possível cogitar que o colaborador, durante a colheita de suas declarações, por si ou por intermédio da defesa técnica que o acompanhou no ato, expressasse insurgência contra tal proceder, todavia, na hipótese concreta não se verifica, a tempo e modo, qualquer impugnação, somente tardiamente veiculada. Assim, considerando a falta de impugnação tempestiva e observada a recomendação normativa quanto à formação do ato, a imagem do colaborador não deve ser dissociada dos depoimentos colhidos, sob pena de verdadeira desconstrução de ato processual perfeito e devidamente homologado. À luz dessas considerações, tenho como pertinente o pedido para levantamento do sigilo, em vista da regra geral da publicidade dos atos processuais. 5. Ante o exposto: (i) determino o levantamento do sigilo dos autos; (ii) defiro o pedido do Procurador-Geral da República para a utilização de cópia dos termos de depoimentos dos colaboradores Mário Amaro da Silveira (Termo de Depoimento n. 4) e Fernando Luiz Ayres da Cunha Santos Reis (Termos de Depoimento ns. 10 e 13), e documentos apresentados, perante o Superior Tribunal de Justiça. Registro que a presente deliberação não importa definição de competência, a qual poderá ser avaliada nas instâncias próprias. Oficie-se e, após, arquivem-se. Publique-se. Intime-se. Brasília, 4 de abril de 2017. Ministro EDSON FACHIN Relator

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