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Opinião - Extinção do Dia das Mães nas escolas 'corrige grande equívoco', diz professor

'Os profissionais da educação precisam estar preparados e capacitados para lidar com a diversidade', diz professor.

Por Silvanio Coelho Mota 1.867
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10/05/2019 17h13 - Atualizado há 4 anos
Silvanio Coelho Mota

Acertadamente, a Secretaria Estadual da Educação do Tocantins decidiu comemorar o “Dia das Famílias na Escola”, com o título “Dia de Quem Cuida de Mim”, e não somente o Dia das Mães ou o Dia dos Pais. Essa decisão vem corrigir um grande equívoco sobre as famílias, sobretudo as novas que vêm surgindo e, consequentemente, obrigando a escola a discuti-las.

A Constituição Federal de 1988 enlaçou o conceito de família, outorgando-lhes especial proteção, inclusive a outras estruturas de convívio, eis que o conceito de família mudou. Como diz Maria Berenice Dias, “se esgarçou” ao longo do tempo.

A família, sem dúvida, é uma das instituições mais importantes da sociedade e ela vem, ao longo do tempo, passando por diversas transformações, alterando o seu significado de acordo com o ambiente e com o momento histórico em que se encontra, frisa a grande doutrinadora.

Assim, passaram a ser reconhecidas outras formas de família, diferentes daquela vista por muitos como a forma “tradicional”. E, como dissemos, a partir da CF/88, elas passaram a ser juridicamente reconhecidas, tendo, portanto, seus direitos resguardados por lei.

A Justiça reconheceu que o rol constitucional não é exaustivo, conforme Maria Berenice Dias, e continuou a reconhecer como família outras estruturas familiares. Assim as famílias anaparentais, constituídas somente pelos filhos, sem a presença dos pais; as famílias parentais, decorrentes do convívio de pessoas com vínculo de parentesco; bem como as famílias homoafeitivas, que são as formadas por pessoas do mesmo sexo. 

Podemos, portanto, nos deparar com as seguintes modalidades, resumidamente:

- Família Matrimonial: aquela formada pelo casamento, tanto entre casais heterossexuais quanto homoafetivos.

- Família Informal: formada por uma união estável, tanto entre casais heterossexuais quanto homoafetivos.

- Família Monoparental: família formada por qualquer um dos pais e seus descendentes. Ex.: uma mãe solteira e um filho.

- Família Anaparental: Prefixo Ana = sem. Ou seja, família sem pais, formada apenas por irmãos.

- Família Unipessoal: Quando nos deparamos com uma família de uma pessoa só. Para visualizar tal situação devemos pensar em impenhorabilidade de bem de família. O bem de família pode pertencer a uma única pessoa, uma senhora viúva, por exemplo.

- Família Mosaico ou reconstituída: pais que têm filhos e se separam, e eventualmente começam a viver com outra pessoa que também tem filhos de outros relacionamentos.

- Família Simultânea/Paralela: se enquadra naqueles casos em que um indivíduo mantém duas relações ao mesmo tempo. Ou seja, é casado e mantém uma outra união estável, ou, mantém duas uniões estáveis ao mesmo tempo.

- Família Eudemonista: família afetiva, formada por uma parentalidade socioafetiva.

O reconhecimento da homoafetividade como união estável foi levado a efeito pelo Supremo Tribunal Federal, no ano de 2011, em decisão unânime e histórica. O tema acabou regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça. Agora é proibido negar acesso ao casamento e impedir o registro das uniões homoafetivas, estando assegurada a possibilidade de estas se transformarem em casamento.

Também se deve à iniciativa do Poder Judiciário assegurar aos homossexuais, vivendo sozinhos ou em família, o direito de adotarem crianças, bem como fazerem uso das técnicas de reprodução assistida.

Isto posto, agora esta é a realidade: homossexuais casam, têm filhos, ou seja, são uma família! E a escola não pode mais ignorar esta realidade, essa nova família, pois a escola é para todos, de tal forma que a visibilidade de novas configurações familiares requer novos panoramas escolares.

Por conta disso, entende-se que os profissionais da educação precisam estar preparados e capacitados para lidar com a diversidade, para resguardar os direitos dos discentes, respeitando e compreendendo seu contexto familiar.

Percebe-se também que a relação entre a escola e família é fundamental para o bom desenvolvimento, adaptação e interação social de toda criança, adolescente e jovem. Com isso reconhece-se que o respeito em relação à família do estudante influencia no bem-estar do aluno, independentemente de sua configuração familiar.

Assim, se quisermos promover uma educação intercultural em perspectiva crítica e emancipatória, inclusive, que respeite e promova os direitos humanos e que articule questões relativas à igualdade e à diferença, como assinala Vera Maria Candau (2008), devemos privilegiar a atenção a essas novas questões nas escolas, discutir as representações como raça, gênero, discriminação, famílias, visando melhores condições de vida para os grupos marginalizados, com superação do racismo, da discriminação de gênero e da homofobia.

Daí que a humanização da educação se pauta nessa reflexividade e faz com que a escola se volte também a essas novas e desafiadoras questões. Eis que a decisão da Seduc-TO, portanto, é um grande passo.

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Silvanio Coelho Mota é professor da rede pública estadual de ensino do Tocantins e mestre em educação pelo PPGE/UFT

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O texto não reflete, necessariamente, a opinião do AF Notícias

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