<div style="text-align: justify;"> <span style="font-size:14px;">Há dois anos o Brasil se estarreceu com mais uma tragédia em razão da quantidade de pessoas mortas. Foram quase mil pessoas identificadas, e muitas nunca foram localizadas na região Serrana do Rio de Janeiro.<br /> <br /> De tão repetidas, pelas mesmas causas e trazendo os mesmos efeitos, ninguém se consterna mais quando o número de mortos não alcança as centenas. Isso serve para as chacinas, os acidentes automobilísticos e outras catástrofes.<br /> <br /> Mas Petrópolis choca novamente, agora pela repetição em tão pouco tempo.<br /> <br /> Qualquer cidadão comum sabe o período das chuvas. No Rio de Janeiro existem órgãos oficiais, com muitos cargos comissionados e fortunas gastas na manutenção dessas instituições, exatamente para evitar as construções irregulares e os desabamentos. Existem secretarias para autorizar e fiscalizar a construção das moradias de acordo com as exigências legais e com a segurança adequada aos moradores. Burocraticamente tudo perfeito. Só na burocracia.<br /> <br /> Somente após a repetição das tragédias surgem algumas medidas. Virou moda criar um gabinete de crise. De efeito prático, só algumas entrevistas do governador e de seus secretários. De prático, o espaço físico ocupado. Também, à la Estados Unidos, as autoridades passaram a sobrevoar as áreas afetadas para, como sempre, verem o caos de cima. De prático, as autoridades aparecem nos telejornais da televisão e constatarem que o problema é grande demais e não terá solução. E a mais inovadora das medidas foram as instalações de sirenes para avisar aos moradores que a morte se avizinha.<br /> <br /> No Brasil é assim porque a ilegalidade é a regra. Alguém só constrói num lugar proibido à custa de omissão ou de comissão. O Ministério Público e os demais órgãos de fiscalização não se manifestam no sentido de obrigarem as autoridades a proibirem as construções irregulares para punirem pelas mortes escancaradamente previsíveis. Quem tem o dever de zelar e não o faz, comete crime. Quem assume o risco de matar alguém, seja por ação ou por omissão, comete crime com dolo eventual. Nem os prefeitos que roubaram as verbas e os mantimentos dos sobreviventes são punidos.<br /> <br /> Única coisa nova nessa tragédia de Petrópolis foi a constatação da presidenta Dilma Rousseff de que precisam adotar medidas drásticas para retirar as pessoas das áreas de risco. Nossa, presidenta! É deprimente ter uma autoridade máxima que leve tanto tempo - e depois de tantas vidas perdidas - para fazer uma constatação tão óbvia.<br /> <br /> Depois de tantas mortes nenhum gato pingado foi protestar em frente ao Palácio do governo do Rio, alguns nem sabem onde fica a sede da prefeitura. Nem uma TV abriu seu telejornal com um editorial criticando essa inércia permanente, nem um jornal colocou na capa os rostos das dezenas de vítimas fatais.<br /> <br /> No Brasil o anormal é normal, a regra é a irregularidade. Quem se manifesta ou exige é um chato. A função essencial de todos os órgãos é ter cargos comissionados ocupados pelos amigos do governador ou do prefeito. A maioria não sabe ao certo as suas funções, pois elas não existem.<br /> <br /> Todos sabem que nenhuma providência efetiva será tomada, que mortes voltarão com as próximas chuvas e os governadores sobrevoarão as áreas de risco. Pelo que é feito atualmente, daqui a 50 anos as pessoas continuarão morrendo arrastadas pelas chuvas, como hoje. Já os governadores e prefeitos continuarão livres para matar sem nenhuma consequência, porque as áreas são de risco, mas nem sequer mencionam o risco de quê.<br /> <br /> <u><strong>Pedro Cardoso da Costa</strong></u> – Interlagos/SP<br /> Bacharel em direito</span></div>