Na década de 1970, um bebê foi entregue pela mãe biológica para um casal de fazendeiros, na região de Pedro Afonso, nordeste do Tocantins, a 173 quilômetros de Palmas. Ele viveu com o casal, que tem quatro filhos, mas jamais foi adotado formalmente durante os mais de 30 anos de convivência com a família. Com a morte do homem (em 2003) e da mulher (em 2014), ele recorreu à Justiça pedindo o reconhecimento de sua filiação socioafetiva e o direito de receber parte da herança deixada pelo casal. A história recebeu sentença favorável da juíza
Luciana Costa Aglantzakis, da 1ª Vara Cível da Comarca de Pedro Afonso. De acordo com o processo, o autor viveu em família e praticou, junto com os demais filhos do casal, todos os afazeres e serviços na casa e na fazenda da família, inclusive vivendo na mesma propriedade até se casar. O homem afirma que a adoção informal era reconhecida pela família e pela sociedade da cidade de Pedro Afonso e região. As declarações do autor receberam confirmação de testemunhas e de uma das filhas do casal, que anexou uma declaração ao processo o reconhecendo como "irmão adotivo de fato". Os outros três apresentaram contestação ao pedido. Ao analisar o caso, a juíza lembra que desde a Constituição Federal de 1988 não há mais distinção entre os tipos de filiação (legítima, ilegítima, natural, adotiva, ou adulterina) e que o princípio da igualdade entre os filhos proíbe qualquer discriminação entre os filhos. Também pontua que o Estatuto da Criança e do Adolescente coloca para a socioafetividade os efeitos jurídicos semelhantes à adoção, como declaração do estado de filho afetivo, mudança no registro civil de nascimento, com adoção do sobrenome, a herança entre pais, filhos e parentes sociológicos, entre outros.
“Sendo a filiação socioafetiva, pela posse do estado de filho, uma adoção não reconhecida legalmente e que ocorreu após as mortes dos ascendentes que criaram do autor é razoável que seja reconhecido e declarado o direito de filiação socioafetiva e bem como o direito de sucessão do autor”, anota a magistrada que, em sentença de mérito, no dia 21 de setembro, a juíza acolheu o pedido do autor com base nos fatos e provas do processo. Na decisão, a juíza declara G. de S. C. como filho de A. L. V. e de A. C. V., para todos os efeitos sucessórios e, sem distinção dos demais filhos do casal, ter direito de receber um quinhão hereditário dos bens e direitos, que estão sendo inventariados em processo que também tramita na Comarca de Pedro Afonso.