“Só por hoje” não serei analfabeto político

Por Redação AF
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31/08/2015 10h00 - Atualizado há 5 anos
<span style="font-size:14px;">&ldquo;S&oacute; por hoje&rdquo; &eacute; um princ&iacute;pio seguido &agrave; risca por alco&oacute;licos an&ocirc;nimos, com resultados comprovados. Mas pode ser um mantra, tamb&eacute;m, contra qualquer tipo de v&iacute;cio.<br /> <br /> A ideia, simples, &eacute; dar um passo de cada vez. A cada 24 horas, uma batalha vencida. Os movimentos conhecidos por AAA &ndash; Associa&ccedil;&atilde;o dos Alco&oacute;licos An&ocirc;nimos &ndash;, surgidos na d&eacute;cada de 30, nos Estados Unidos, e que se espalharam pelo mundo, praticam o lema ainda nos dias atuais, com bons resultados.<br /> <br /> Sem abdicar dos antigos, novos v&iacute;cios t&ecirc;m sido incorporados &agrave; sociedade, como a compuls&atilde;o&nbsp; pelo uso de aparelhos celulares. H&aacute; outros igualmente perniciosos: o v&iacute;cio por consumir informa&ccedil;&atilde;o de p&eacute;ssima qualidade, inclusive nas redes sociais, e o v&iacute;cio de entreter-se com programas de r&aacute;dio e tev&ecirc; que atrofiam a intelig&ecirc;ncia e a capacidade de an&aacute;lise. Incluem-se nesse rol comentaristas famosos de diferentes m&iacute;dias.<br /> <br /> Talvez, justamente por isso, as redes sociais estejam entulhadas de di&aacute;logos e debates de baix&iacute;ssimo n&iacute;vel, em que os xingamentos e a desinforma&ccedil;&atilde;o sejam moeda corrente. E que, n&atilde;o raro, descambam para um super&aacute;vit de &oacute;dio e um d&eacute;ficit de solidariedade. Gra&ccedil;as &agrave;s redes sociais, descobrimos que aquele cidad&atilde;o que parece t&atilde;o fino e educado, cheio de gentilezas e que aparenta ser adepto de causas nobres, na verdade esconde um troglodita, machista, reacion&aacute;rio, ego&iacute;sta, homof&oacute;bico, desinformado e mal-educado.&nbsp; N&atilde;o necessariamente nessa ordem.<br /> <br /> Por isso, para p&ocirc;r um pouco de &aacute;gua na fervura e, quem sabe, serenar os &acirc;nimos, pensei em resgatar o lema que tem mantido longe do v&iacute;cio tantas pessoas que, no passado, estiveram &agrave;s portas do inferno. Se n&atilde;o nos levar ao c&eacute;u, pelo menos poderemos viver e dialogar mais civilizadamente.<br /> <br /> Ent&atilde;o&hellip;<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em> n&atilde;o chamarei de petralha ou de coxinha nenhum de meus advers&aacute;rios pol&iacute;ticos e&nbsp; ideol&oacute;gicos. Categorizar conceitos pejorativos e reducionistas em nada colabora para a tentativa de manter um di&aacute;logo com respeito. Para aqueles casos em que a rec&iacute;proca n&atilde;o for verdadeira, mantenha-se afastado. N&atilde;o perca seu tempo.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje n</em>&atilde;o xingarei, n&atilde;o usarei palavr&otilde;es, nem tentarei ganhar no grito um debate que s&oacute; tem sentido quando&nbsp; houver argumentos e informa&ccedil;&otilde;es fidedignas&nbsp; e sensatas sobre aquilo que se procura demonstrar. Ou seja, vale a pena fazer um esfor&ccedil;o para diversificar as fontes e informar-se melhor sobre o que acontece no pa&iacute;s e no mundo.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em> n&atilde;o direi que &ldquo;&eacute; tudo culpa da Dilma&rdquo;, seja l&aacute; o que aconte&ccedil;a no pa&iacute;s. Afinal, vivemos numa Rep&uacute;blica Federativa e as principais inst&acirc;ncias de poder s&atilde;o o Executivo, o Legislativo e o Judici&aacute;rio, que, por sua vez, operam nas esferas federal, estadual e municipal. Farei um esfor&ccedil;o para lembrar que a responsabilidade precisa ser dividida no m&iacute;nimo com mais 27 governadores, 5.570 prefeitos, 81 senadores, 513 deputados federais, 1.059&nbsp;&nbsp; deputados estaduais, cerca de 60 mil vereadores e 20 mil ju&iacute;zes espalhados por todo o pa&iacute;s. Sem falar em milhares de importantes entidades representativas dos mais diversos setores da sociedade.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em> n&atilde;o direi que esquerda e direita s&atilde;o &ldquo;tudo a mesma coisa&rdquo;. Para esclarecer melhor tudo aquilo que n&atilde;o compreendo muito bem, melhor come&ccedil;ar por ler o livro cl&aacute;ssico de Norberto Bobbio sobre o tema. H&aacute; outros igualmente bons, &eacute; s&oacute; procurar.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em> n&atilde;o direi que a pol&iacute;tica e todos os pol&iacute;ticos n&atilde;o prestam e procurarei estudar um pouco mais, sobretudo ci&ecirc;ncia pol&iacute;tica, hist&oacute;ria e sociologia, para tentar entender as engrenagens do poder e, quem sabe, a partir da&iacute;, contribuir decisivamente para a cria&ccedil;&atilde;o de pol&iacute;ticas p&uacute;blicas que visem ao bem comum, ao bem-estar coletivo.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje </em>n&atilde;o direi que a pol&iacute;tica de cotas (pol&iacute;ticas afirmativas) &eacute; uma injusti&ccedil;a e vai prejudicar a qualidade do ensino. Primeiro, comprometo-me a ler com mais aten&ccedil;&atilde;o a hist&oacute;ria dos negros no Brasil e, na sequ&ecirc;ncia, divulgarei as pesquisas que demonstram que a maioria daqueles que entraram por cotas nas universidades brasileiras tem um desempenho igual ou superior aos que acessaram o ensino superior por outros meios.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje </em>n&atilde;o vou converter-me &agrave; ideia de que problemas de seguran&ccedil;a p&uacute;blica devem ser resolvidos &agrave; bala. Consultarei a vasta bibliografia sobre o assunto que desmente, categoricamente, a ideia de que a &ecirc;nfase na repress&atilde;o e a cria&ccedil;&atilde;o e manuten&ccedil;&atilde;o de um sistema de seguran&ccedil;a baseado na discrimina&ccedil;&atilde;o possam p&ocirc;r um fim &agrave; viol&ecirc;ncia.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em> evitarei o uso de falas e comportamentos machistas, para que a rela&ccedil;&atilde;o entre duas&nbsp; ou mais pessoas seja sempre baseada na igualdade, na dignidade e no respeito &agrave;s diferen&ccedil;as. Igualmente repudiarei os estere&oacute;tipos machistas da publicidade e me posicionarei contra atitudes cotidianas que refor&ccedil;am esses h&aacute;bitos.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em> n&atilde;o reclamarei do engarrafamento no tr&acirc;nsito se estiver sentado em um autom&oacute;vel. Afinal, concluirei, &eacute; a minha presen&ccedil;a ali, juntamente com milhares de outros condutores de autom&oacute;veis, a raz&atilde;o de um tr&acirc;nsito que n&atilde;o anda. Aproveitarei o tr&aacute;fego parado para refletir sobre a import&acirc;ncia de apoiar a constru&ccedil;&atilde;o de ciclovias e dar prioridade ao transporte p&uacute;blico de qualidade.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em> n&atilde;o vou ridicularizar e hostilizar pessoas com prefer&ecirc;ncias sexuais diferentes da minha. Tentarei compreender que o desejo sexual independe de g&ecirc;nero e que n&atilde;o h&aacute; nada errado nisso, ao contr&aacute;rio da homofobia. Se persistirem os sintomas homof&oacute;bicos, procurarei&nbsp; ajuda. Talvez Freud explique.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em> buscarei novas formas de me manter informado, diferente das fontes habituais, para que n&atilde;o me torne ref&eacute;m de interesses particulares, n&atilde;o raro economicistas, que favorecem grupos minorit&aacute;rios, e que, no entanto, se apresentam como porta-vozes de interesses justos e igualit&aacute;rios.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em> n&atilde;o acreditarei que recentes investiga&ccedil;&otilde;es sobre il&iacute;citos sejam par&acirc;metro para afirmar que &ldquo;nunca houve tanta corrup&ccedil;&atilde;o no pa&iacute;s&rdquo;, sem questionar primeiro por que antes essas investiga&ccedil;&otilde;es eram t&atilde;o raras e por que, ainda hoje, o mesmo dinheiro que foi distribu&iacute;do aos principais partidos, por diferentes setores empresariais, &eacute; considerado ilegal para uns e absolutamente honesto e sem problema para outros?<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em> entenderei que, num estado laico, como &eacute; o caso do Brasil, pol&iacute;tica e religi&atilde;o n&atilde;o se misturam e credos particulares n&atilde;o podem ser aceitos como objeto de leis e normas para o conjunto da sociedade.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em>, cada vez que come&ccedil;ar uma reclama&ccedil;&atilde;o contra os altos impostos cobrados pelo governo federal, tentarei lembrar-me de que alguns dos principais impostos que me afetam&nbsp; diretamente, como o ICMS, o IPVA e o ISS s&atilde;o impostos estaduais e que o IPTU &eacute; um imposto municipal.&nbsp; E decidirei reclamar, com a mesma intensidade, da sonega&ccedil;&atilde;o de impostos, que desvia bilh&otilde;es de reais que fazem falta &agrave;s pol&iacute;ticas p&uacute;blicas do pa&iacute;s. De b&ocirc;nus, investigarei por que as camadas mais ricas pagam, proporcionalmente, t&atilde;o poucos impostos no pa&iacute;s, ao contr&aacute;rio do que acontece em na&ccedil;&otilde;es sempre citadas como exemplo de sociedades desenvolvidas.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em> evitarei falar e publicar nas redes sociais a primeira ideia que me vem &agrave; cabe&ccedil;a, sem refletir, inicialmente, se n&atilde;o estou reproduzindo aquilo que me foi incutido por ve&iacute;culos de comunica&ccedil;&atilde;o e institui&ccedil;&otilde;es da sociedade com interesses muito particulares,&nbsp; tendo como resultado um pensamento que n&atilde;o &eacute; necessariamente meu, mas orientado para reproduzir conceitos que interessam a outros, sem que eu nunca tenha me dado conta, ainda, disso. Como ant&iacute;doto, buscarei bons livros e boas fontes de informa&ccedil;&atilde;o e conhecimento, na tentativa de me &ldquo;deseducar&rdquo; um pouco e compreender que o mundo e as rela&ccedil;&otilde;es podem ser muito diferentes do que hoje s&atilde;o e que mudar isso n&atilde;o &eacute; uma impossibilidade.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje</em>, n&atilde;o repetirei ideias-clich&ecirc;s do tipo &ldquo;no Brasil n&atilde;o tem racismo&rdquo;, &ldquo;s&oacute; &eacute; pobre quem n&atilde;o trabalha&rdquo;, &ldquo;direitos humanos s&oacute; servem para proteger marginais&rdquo;, &ldquo;na ditadura era tudo melhor, n&atilde;o tinha corrup&ccedil;&atilde;o&rdquo;, &ldquo;negros tamb&eacute;m t&ecirc;m preconceito contra os brancos&rdquo;, &ldquo;o mensal&atilde;o &eacute; o maior esc&acirc;ndalo de corrup&ccedil;&atilde;o da hist&oacute;ria do pa&iacute;s&rdquo;, &ldquo;pol&iacute;tico &eacute; tudo ladr&atilde;o&rdquo;, &ldquo;tudo que &eacute; p&uacute;blico n&atilde;o funciona&rdquo;, &ldquo;o mercado regula&rdquo;, &ldquo;o mundo est&aacute; cada vez pior&rdquo;, &ldquo;no Brasil nada d&aacute; certo&rdquo;, &ldquo;bandido bom &eacute; bandido morto&rdquo; etc. etc. Se quero compreender os fen&ocirc;menos sociais, prometo, vou estudar e ler &ndash; ler muito &ndash;, para n&atilde;o dizer bobagens inconsistentes.<br /> <br /> <em>S&oacute; por hoje.</em></span><br /> <br /> <span style="font-size:14px;">Celso Vicenzi &eacute; jornalista, ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas/SC, Pr&ecirc;mio Esso de Ci&ecirc;ncia e Tecnologia (1985). Atuou em r&aacute;dio, TV, jornal, revista e assessoria de imprensa. Autor de &quot;Gol &eacute; Orgasmo&quot;, editora Unisul - ilustra&ccedil;&otilde;es de Paulo Caruso. Escreve humor no tw&iacute;ter: <a href="http://@celso_vicenzi">@celso_vicenzi</a>. Para contato:<a href="http://vicenzi@newsite.com.br"> vicenzi@newsite.com.br</a></span><br /> <br />
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