O fenômeno Sherazade e a ebulição da impunidade

Por Redação AF
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12/02/2014 08h26 - Atualizado há 5 anos
<div style="text-align: justify;"> <span style="font-size:14px;"><u>Marcus Reis</u><br /> <br /> Nestes dias em que estive distante dos blogs, portais e redes sociais, aproveitei&nbsp;para observar, com consider&aacute;vel aten&ccedil;&atilde;o e, porque n&atilde;o dizer, preocupa&ccedil;&atilde;o, alguns fatos&nbsp;que me levaram a refletir, n&atilde;o somente como jurista das ci&ecirc;ncias criminais, mas&nbsp;principalmente como ser humano, a respeito da t&atilde;o analisada &ldquo;sociedade brasileira&rdquo;.<br /> <br /> O que a maioria de n&oacute;s tem aprendido, e em muitos casos acreditado, &eacute; que o&nbsp;indiv&iacute;duo &eacute; influenciado e tende a ser transformado pelo meio em que vive. Nesta&nbsp;mesma linha de pensamento, &eacute; comum crer tamb&eacute;m que o homem, pela sua&nbsp;predisposi&ccedil;&atilde;o socializadora, busca alternativas para que todos se ajustem, de modo que&nbsp;n&atilde;o haja divis&atilde;o entre as classes sociais, e toda aquela heran&ccedil;a do discurso marxista que&nbsp;ainda insiste impregnar.<br /> <br /> Os &uacute;ltimos dias tem sido a prova inconteste de que a m&aacute;xima de Thomas&nbsp;Hobbes: &ldquo;o homem &eacute; o lobo do homem&rdquo; come&ccedil;a a fazer sentido, quando encontramos a&nbsp;barb&aacute;rie e a viol&ecirc;ncia fazendo parte do cotidiano, com tremenda naturalidade. N&atilde;o&nbsp;encontramos, todavia, atualmente, um ambiente onde a escassez de alimentos, f&aacute;rmacos&nbsp;e um relativo conforto sejam necessidades prementes, irremedi&aacute;veis e inalcan&ccedil;&aacute;veis, de&nbsp;modo a dar completo solo &agrave; tese do filosofo ingl&ecirc;s. Mas a realidade demonstra que, de&nbsp;fato, o homem, na necessidade instintiva de viver em seguran&ccedil;a e sentindo-se&nbsp;desprotegido pelo Estado, que &eacute; quem de direito a suprir esta falta, passa a usar seu&nbsp;pr&oacute;prio senso de justi&ccedil;a, a fim de que seus descendentes, comunidades e a pr&oacute;pria ra&ccedil;a&nbsp;sejam resguardadas do mal maior.<br /> <br /> &Eacute; natural, em grupos de animais, um predador, quando surge sozinho, ser&nbsp;afugentado pela quantidade do bando. Entre os seres humanos tamb&eacute;m prevalece essa&nbsp;l&oacute;gica. Quem, ent&atilde;o, s&atilde;o os nossos predadores? O que pensamos como amea&ccedil;as &agrave; nossa&nbsp;esp&eacute;cie? O que estamos, instintivamente fazendo, para proteger as gera&ccedil;&otilde;es futuras?<br /> <br /> O discurso ambientalista, humanista e defensor da vida sustent&aacute;vel fica longe do&nbsp;que de fato &eacute; a compreens&atilde;o de defesa e prote&ccedil;&atilde;o da esp&eacute;cie. Assim, neste sentido,&nbsp;posso afirmar com bastante seguran&ccedil;a que os linchamentos p&uacute;blicos, as rea&ccedil;&otilde;es&nbsp;agressivas coletivas contra criminosos e ainda a sensa&ccedil;&atilde;o de satisfa&ccedil;&atilde;o e prazer ao ver&nbsp;tais cenas comp&otilde;em o mais natural sentimento do ser humano que &eacute; a da defesa da&nbsp;esp&eacute;cie. Cabe-nos, entrementes, um questionamento bem pontual: quem &eacute;, para n&oacute;s,&nbsp;mais amea&ccedil;ador? Aquele que vem tomar o patrim&ocirc;nio ou a vida, ou aquele que se omite&nbsp;de nos defender, quando deveria? De certo modo, ambos se igualam, criando essa&nbsp;constatado estado de impunidade institucionalizada.<br /> <br /> O homem, ainda que declaradamente humanista, sente-se no dever de proteger&nbsp;sua esp&eacute;cie, ainda que para isso seja necess&aacute;rio sacrificar outra vida humana. E n&atilde;o&nbsp;culpem a Sheherazade por isso, n&atilde;o. Pelo contr&aacute;rio, ela traduz, de maneira bastante&nbsp;expl&iacute;cita, o que todos n&oacute;s somos e far&iacute;amos, em situa&ccedil;&otilde;es extremas. A inseguran&ccedil;a &eacute;&nbsp;patente, inconteste e patol&oacute;gica e, em muitos casos, o pr&oacute;prio Estado a fomenta,&nbsp;sustentando um falso discurso protecionista e garantista. N&atilde;o seria, ele, o pior assassino,&nbsp;ao n&atilde;o investir em educa&ccedil;&atilde;o, qualifica&ccedil;&atilde;o, sa&uacute;de e outras pol&iacute;ticas p&uacute;blicas eficazes e&nbsp;notadamente carentes de recursos?<br /> <br /> O que a rep&oacute;rter falou, a contr&aacute;rio sensu dos &ldquo;certinhos de plant&atilde;o&rdquo;, &eacute; a mais&nbsp;pura verdade. Eu particularmente, ainda completaria com a seguinte afirma&ccedil;&atilde;o: N&atilde;o&nbsp;somos obrigados a obedecer ao Estado quando ele, mesmo que &ldquo;legal&rdquo;, torne-se&nbsp;&ldquo;imoral&rdquo;.</span><br /> <br /> <span style="font-size:14px;"><u><strong>Marcos Reis</strong></u> <span style="font-size:12px;"><em>&eacute; advogado criminalista, historiador, escritor e professor de&nbsp;Direito Constitucional e Penal. Natural de Bel&eacute;m do Par&aacute; &eacute; casado e reside&nbsp;em Aragua&iacute;na, onde exerce a advocacia, atuando ainda nos Estados do Par&aacute;,&nbsp;Goi&aacute;s e no Distrito Federal. Pertence &agrave; Academia Paraense de Letras.</em></span></span></div>
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