Sítio arqueológico histórico

Cemitério quilombola no Tocantins é declarado sítio arqueológico e agora tem proteção federal

Cemitério pode ter corpos de pessoas escravizadas ou sobreviventes da escravidão.

Por Redação
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13/11/2023 16h54 - Atualizado há 5 meses
Cemitério abriga entes queridos da Comunidade Quilombola do Rio Preto

Reconhecido oficialmente como sítio arqueológico histórico nesta segunda-feira (13), o cemitério Campo Santo do Bom Jardim, pertencente à Comunidade Quilombola Rio Preto, no município de Lagoa do Tocantins, passa a ser uma área sob a proteção da União. Demandada pela Secretaria dos Povos Originários e Tradicionais do Tocantins (Sepot), a homologação foi feita pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

O reconhecimento do Campo Santo do Bom Jardim como sítio arqueológico representa um momento histórico. “É a valorização do patrimônio material e imaterial do Tocantins. Esse reconhecimento dá forças às nossas raízes quilombolas. Isso fortalece a comunidade. O Campo Santo do Bom Jardim simboliza o que é de maior, que é o nosso bem cultural, a nossa identidade, quem nós somos. É muita emoção para nós fazermos parte desse reconhecimento, juntamente com o Iphan”, ressaltou a gestora da Sepot, Narubia Werreria.

O arqueólogo do Iphan Rômulo Macêdo Barreto de Negreiros, que elaborou o relatório técnico para o reconhecimento, explicou as características que levaram ao reconhecimento do cemitério enquanto sítio arqueológico. “Além de ser um local que faz referência à memória da comunidade quilombola do Rio Preto, o Campo Santo do Bom Jardim é excepcional no contexto dos cemitérios rurais do Tocantins. Ele apresenta uma variedade de tipos de lápides que, provavelmente, refletem as relações sociais dos quilombolas ao longo dos últimos cem anos”, afirmou.

O profissional explicou que com a homologação do seu cadastro enquanto sítio arqueológico na base de dados do Iphan, o Campo Santo do Bom Jardim passa a ser considerado Patrimônio Cultural Brasileiro, conforme os termos do artigo 216 da Constituição Federal de 1988, sendo protegido  pela lei nº 3924/1961.

“Com isso, o bem cultural passa a ser tutelado pelo poder público, cabendo ao Iphan seu acautelamento. Além disso, qualquer dano que venha a ser provocado no cemitério, com ou sem intenção, será considerado crime ambiental, conforme a Lei Federal nº 9605/1998, passível de multa e detenção. O reconhecimento enquanto sítio arqueológico assegura ainda o desenvolvimento de ações voltadas para a proteção e promoção do bem”, afirmou Negreiros.

Arqueólogo do Iphan Tocantins, Rômulo Macêdo Barreto de Negreiros

Histórico

Ao tomar conhecimento das invasões e atos violentos ocorridos contra a Comunidade Quilombola do Rio Preto, as equipes da Sepot se mobilizaram, atuando em diversas frentes para afastar as ameaças incidentes. A própria secretária esteve por três vezes na comunidade, acompanhada pela diretora de Proteção aos Quilombolas e técnicos da Sepot, em busca de garantir a proteção do território e seu povo. Em uma das visitas, a técnica em agrimensura da Sepot participou para fazer a verificação da área, foi quando ouviu de um morador sobre a existência do cemitério centenário e insistiu para visitar o local. Primeiramente houve a negativa, visto que o cemitério encontra-se em uma área na qual, segundo ele, não poderiam entrar por estarem ameaçados, dada a disputa territorial com fazendeiros da região.

“Quando vi a precisão dos jazigos com encaixes de pedra feitos à mão, parecia que eu estava em um museu. A precisão da arte que eles fizeram com carinho e respeito ao seu ente que faleceu, junto às datas cravadas nas lápides, foi fundamental”, disse Lorayne Ferreira, especialista em georreferenciamento da Sepot, a primeira a fotografar e marcar a localização. A partir de então, a pasta deu entrada com o pedido de reconhecimento de sítio arqueológico, junto ao Iphan, que agora se concretiza.

Empregando técnicas arqueológicas de reconhecimento da área, observação e registros, com utilização, por exemplo, de pincel, papel manteiga e carvão, trena, máquina fotográfica e anotações, o arqueólogo realizou algumas constatações. “A comunidade utilizou, ao longo do tempo, uma série de técnicas construtivas para fazer as sepulturas, com pedras aparelhadas, pedras simples e pedra canga, indicação de área com estacas de madeira”, explicou o arqueólogo do Iphan, Rômulo Macêdo Barreto de Negreiros.

A datação das lápides, conforme comprovado, é centenária. Há datas que atravessam todo o século 20, as mais antigas são de 1919. O arqueólogo afirmou que pode haver pessoas sepultadas ali que foram escravizadas ou sobreviventes da escravidão.  

Atuação da Sepot na proteção dos territórios Quilombolas

Desde a sua criação, a Sepot tem acompanhado o processo de regularização deste e de outros quilombos no Estado, bem como levantando dados sobre as ameaças sofridas por essas comunidades e articulando para a criação e implementação de políticas públicas que assegurem os direitos desses povos tradicionais.

O reconhecimento da comunidade de Rio Preto, como quilombola, pela Fundação Cultural Palmares, ocorreu no tempo recorde de três meses, processo orientado pela Sepot junto à comunidade que resultou na certificação que será entregue à comunidade no dia 23 deste mês.

A fim de discutir a adesão do Tocantins ao Programa Nacional de Gestão Territorial Ambiental Quilombola (PNGTAQ), o Governo do Tocantins esteve reunido com o Ministério da Igualdade Racial (MIR). Na reunião, estiveram presentes representantes da Sepot, da Secretaria Estadual do Planejamento e Orçamento (Seplan) e da Secretaria Especial de Representação em Brasília (Serb).

Lápide mais antiga no cemitério é do ano 1919

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